Nos últimos dois anos, você, eu, todas nós fomos bombardeadas pela cultura do bem-estar. O autocuidado se transformou em uma alternativa para combater o estresse.
No entanto, a Geração Z já deu o alerta: Essa pressão imposta pela cultura do bem-estar pode ser prejudicial para a nossa saúde mental — não à toa, vemos uma onda de rotinas mais tolerantes, fluidas e minimalistas.
“Hoje, percebemos que, cada vez mais, a imposição de padrões do que é ser bem-sucedido, saudável, feliz é bem danosa e cria expectativas desnecessárias nas pessoas.”, observa Hanne Lima, especialista em tendências na WGSN, empresa especializada em tendências de comportamento e consumo.
“Partimos do entendimento de que estar feliz é algo momentâneo. É importante entender que somos feitos de ciclos e nenhum sentimento é uma constante.”
“Estar bem é estar bem consigo mesmo. É estar em equilíbrio com o corpo, mente e alma e não se preocupar com os padrões e regras, não se comparar com o que está fora.”, alerta Priscila de Charbonnières, life coach fundadora do Soulloop e membro da The Theosophical Society of London.
“Vivemos em uma sociedade altamente acelerada em relação ao consumo. Inclusive, o próprio mercado do bem-estar também tem o seu lado consumista. Somos bombardeados de informações o tempo inteiro e quando tentamos absorver todas as informações, saímos do do bem-estar e vamos em direção a algo externo que não faz parte de nós.”
Para Carl Cederström e André Spicer, autores de “The Wellness Syndrome” (a Síndrome do Bem-Estar, em tradução livre), a pressão para estar bem e feliz, ter uma saúde otimizada para um corpo que performa com toda a sua capacidade, pensando somente na sua individualidade, faz com que a pessoa se sinta ainda pior.
“São hábitos como ir a extremos para encontrar a dieta perfeita, o monitoramento obsessivo de todas as suas atividades, e aperfeiçoar a sua rotina para incluir o máximo de rituais de bem-estar possível.”, diz Hanne.
Um bom exemplo? A personagem Cassie, de “Euphoria”, que acorda todo dia às 4h da manhã para começar sua rotina maníaca de beleza e skincare.
O perigo da obsessão no autocuidado
“A cilada mora em criar uma equivalência entre o quão saudável e feliz você é, com a sua produtividade, com o seu valor como pessoa; para muitos que passam por isso, ser saudável e produtivo se iguala a ser uma boa pessoa.”, fala Hanne.
“Segundo, deixar de entender que você também é afetado pelo mundo ao seu redor, pela saúde da sua comunidade como um todo e acontecimentos externos, e se individualizar a ponto de estar alienado a essa realidade. A positividade tóxica vem desses lugares.”
Em outras palavras, quando o nosso bem-estar se torna dependente do conforto pelo controle das situações, ele se restringe a essa segurança no autocuidado.
“Porém, quando ele é atingido com a consciência da dinâmica de necessidades das exigências do corpo, mente e espírito, todo esse nosso investimento em saúde nos leva a acessar essa restauração do estar ‘bem’ com maior fluidez.”, observa Mylla Carneiro, médica da clínica Awake Health (SP), pós-graduada em Saúde Integrativa pelo Hospital Albert Einstein e formada em Neurociência do Comportamento.
“Quando cuidar da nossa saúde deixa de ser leve e se torna uma autorresponsabilidade comparativa, podemos estar alimentando uma busca por viver esse bem-estar como algo fora de nós e completamente dependente de se encaixar em determinados padrões de experiências.”, complementa.
Não somos constantes quando o assunto é autocuidado
A medida certa para essa busca é mantê-la razoável, não deixar que ela se torne obsessiva e aconteça em detrimento da sua saúde e felicidade hoje, o que é bem comum de acontecer na cultura de wellness como a gente conhece.
“A Geração Z considera que não somos constantes e nem perfeitos. A gente vê, inclusive, uma mudança no significado de “holístico” e de saúde — em que uma dieta inclui desde suco verde até martinis. É muito mais sobre equilíbrio.”, diz Hanne.
“Algo interessante quando olhamos para a relação da Geração Z com alimentação, por exemplo, é ver como a motivação por uma alimentação saudável está cada vez mais ligada com saúde mental e manejo do estresse, longe da cultura da dieta e num espaço em que o movimento pela neutralidade corporal está crescendo cada vez mais.”
A felicidade é a saúde da alma e a saúde é a felicidade do corpo. “Se o que nos faz feliz é tão único, o que nos faz saudável também. O autoconhecimento é a única forma de acerto para esse equilíbrio dinâmico no que diz respeito ao nosso autocuidade.”, finaliza Mylla.